terça-feira, 3 de maio de 2011

Brasil deve pôr a casa em ordem se aspira a Conselho da ONU, diz Anistia

Salil Shetty, Secretario Geral da Anistia Internacional visitou o Brasil de 26 a 29 de abril.

Para Secretário Geral da entidade pobreza está na raiz das violações de direitos humanos. "Basta ir a uma favela para entender"

Shetty afirma que brasileiros pobres e árabes que protestam por democracia mostram que direitos humanos são “interdependentes e indivisíveis”. Em comum, o fato de não terem voz.

“As questões estão interligadas: as pessoas nas favelas não têm direitos sociais e econômicos básicos. E falamos sobre isso como se fosse algo em outro lugar: mas está acontecendo bem aqui! A pobreza está na raiz de muitos desses problemas. Na prática, basta ir a uma favela para entender o que isso significa.”

Direitos Humanos

Todo país tem questões. É importante lembrar que, se comparamos o Brasil com outros países, tem um bom histórico... Após a Constituição de 1988 o Brasil instituiu uma série de específicas iniciativas: o plano nacional de direitos humanos, o plano nacional contra a tortura, contra trabalho escravo, o programa de defesa para ativistas de direitos humanos, além de programas sociais e econômicos, como o Bolsa Família.

Há desenvolvimento econômico. O Brasil é um dos poucos países globalmente que reduziram a desigualdade – em muitos, a pobreza caiu, mas não a desigualdade. Claro, pode-se argumentar que o Brasil tem uma das maiores desigualdades do mundo, mas não é um passo fácil de se atingir. O que nos preocupa no Brasil é que há uma grande distância entre as políticas e sua implementação, em várias áreas. Uma das principais é a violência policial e segurança pública. É um fenômeno urbano também, o Brasil tem algumas das maiores cidades do mundo. Também há algum progresso nessa área, mas o nível de assassinatos por policiais é muito alto. Brasil tem grandes populações, mas 20% dos homicídios são causados pela polícia.

Há intimidação e injustiça. Muitas dessas pessoas são pobres, mulheres e crianças.

O trabalho da Anistia é pressionar para que isso mude. Fazemos isso por meio de campanhas, análises e pela mídia, mas muito disso é feito por pressão pública. Vamos entregar ao ministro da Justiça uma petição com mais de 20 mil assinaturas sobre o caso dos guaranis-kaiowá, expulsos de suas terras. Isso vem de uma pressão internacional, mas também queremos fazer os brasileiros se mobilizarem, precisa vir dos brasileiros.

As questões estão interligadas. Estamos discutindo violência policial nas favelas. Mas as pessoas nas favelas não têm direitos sociais e econômicos básicos. A pobreza está na raiz de muitas desses problemas. Por que há tanto tráfico de drogas e dessas coisas que acontecem? As alternativas são muito poucas e ruins. É a indivisibilidade de direitos que as pessoas precisam ter. O Oriente Médio e os países do norte da África mostraram isso de uma maneira clássica. As pessoas que estão protestando agora estão porque não têm emprego e porque não tem voz. São duas coisas de uma só vez. Então, se você está em uma favela é exatamente a mesma coisa. E falamos sobre isso como se fosse algo em outro lugar: mas está acontecendo bem aqui! É uma zona de exclusão constitucional.

 Quando se tem aspiração a ser liderança regional e global – isso vale para Brasil e Índia –, se você quer sentar no Conselho de Segurança da ONU, é bom pôr sua própria casa em ordem. A pressão para isso aumenta. Porque não se pode levantar e falar do Irã se você tem um sistema penitenciário como o do Brasil.

Vão dizer que quem tem teto de vidro não deve atirar pedras

O sr. definiria como ditadura os regimes do Oriente Médio e África do Norte?

Shetty: Veja o que estão fazendo agora. Usam duas estratégias: ou subornam pessoas para ficarem em silencio. ‘Ok, daqui em diante, vão entrar US$ 3.000 em sua conta, mas fique quieto!’ Ou usam força bruta.

Nenhuma das duas está funcionando. Você viu o que aconteceu no Iêmen. Você pode chamar como quiser, mas, basicamente, as pessoas não tem voz. Particularmente, os pobres. No Egito, por exemplo: metade da população do Cairo mora em favelas. Se tem 12 milhões, são 6 milhões. Pobreza e falta de voz andam juntas. Se conversar com a elite egípcia – ou brasileira, ou indiana – eles nem sabem que há uma ditadura.

Quem são os brasileiros agredidos pela polícia? Os pobres, negros, mulheres e crianças. Por isso os direitos humanos são interdependentes e indivisíveis. Teoricamente, se for à declaração verá isso. Mas, na prática, basta ir a uma favela para entender o que isso significa.

Fonte: Home IG/Ultimo segundo.   Salil Shetty Secretário Geral da ONU, concedeu entrevista ao jornalista Raphael Gomide do IG/Rio, sobre Movimentos Sociais e organização, direitos humanos, pobreza, violência policial, redução de pobreza, bolsa família, situação dos presídios, comissão da verdade e justiça, democracia, Conselho da ONU, Oriente Médio e África.Matéria completa no site IG. 

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