segunda-feira, 30 de abril de 2012

ONU comemora legado do Jazz, como força de transformação social


Transformação social, tolerância, igualdade de gênero, liberdade, compreensão mútua, tolerância, paz. 

A ONU, Ornanização das Nações Unidas,  declarou dia 30 de abril como Dia Internacional do Jazz destacando a importância histórica do gênero de musica na reunião de pessoas e  transformação social, diversos eventos em comemoração á data iniciaram-se em 27 de abril.

"De suas raízes na escravidão, essa música tem gerado uma voz apaixonada contra todas as formas de opressão.Ele fala uma língua de liberdade que seja significativa para todas as culturas", declarou a Diretora-geral da ONU educacional, científico e cultural Irina Bokova.

                                                            
Diretora Geral da Unesco Irina Bokova e Embaixador da Boa Vontade Herbie Hancock, em Paris  durante inicío dos eventos em comemoração "Dia Anual do Jazz" 

O Jazz é uma manifestação artístico cultural nascido nos Estados Unidos no início do século XX,  está enraizado   nas tradições africanas.A região de New Orleans,  em suas proximidades é onde originou-se  esta cultura popular construida com a criatividade das comunidades negras que ali desenvolveram um de seus espaços de produção musical de importância e reconhecimento mundial     Na Conferência geral da UNESCO em novembro do ano passado, a comunidade internacional proclamou a 30 de abril como dia internacional de Jazz, com a intenção de sensibilizar a Comunidade Internacional das virtudes do jazz como uma ferramenta educacional e uma força de paz, unidade, diálogo e uma cooperação reforçada entre as pessoas.

Na sua mensagem para celebrar o dia a sra. Irina Bokova, salientou que os valores do Jazz - liberdade, diversidade, compreensão entre culturas e paz - são os mesmos valores proclamados pelas Nações Unidas. "Tirar o máximo partido da diversidade cultural é uma tarefa que todos partilhamos".Como parte das celebrações, além de concertos em Paris, Nova Orleans e Nova York, outros serão realizados em mais de 100 cidades ao redor do mundo.

Na noite de segunda-feira, UNESCO, juntamente com Thelonius Monk Institute of Jazz, vai acolher um concerto na sede da ONU, que contará com um elenco de estrelas dos artistas, entre eles Tony Bennett, Chaka Khan, Angélique Kidjo e Romero Lubambo, bem como o Sr. Hancock. Co anfitriões incluem atores como Robert De Niro, Michael Douglas e Quincy Jones.O concerto será transmitidos ao vivo na  página do YouTube da ONU e estarão disponíveis ao público.

Fonte: ONU


quinta-feira, 26 de abril de 2012

STF julga constitucional política de cotas raciais da UnB

O Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, julgou improcedente a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 186, ajuizada pelo Democratas, que questionava a adoção do sistema de cotas raciais na Universidade de Brasília (UnB).

Último a se pronunciar na sessão de hoje, o presidente da Corte, ministro Ayres Britto, também seguiu o relator da matéria, ministro Ricardo Lewandowski, votando pela constitucionalidade da política de cotas raciais na UnB.

O julgamento, que terminou por volta das 20h, tratou de uma ação proposta pelo DEM contra o sistema de cotas da UnB (Universidade de Brasília), que reserva 20% das vagas para autodeclarados negros e pardos.

http://www.stf.jus.br/portal/cms/listarNoticiaUltima.asp

Fonte: STF

                                       Voto do relator ministro  Ricardo Lewandowski
                        

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Dia do Indio: uma saga de sobrevivência

No governo de Getúlio Vargas, em 2 de junho de 1943, foi editado o Decreto-Lei nº 5540, que estabeleceu o Dia do Índio. A data é comemorada no dia 19 de abril em homenagem ao primeiro Congresso Indigenista Interamericano, em 1940.

                                         Dia do Índio

Desde a edição do decreto instituidor do Dia do Índio até o advento da Constituição de 1988 pouco foi realizado em prol dos indígenas brasileiros. Essa situação foi alterada a partir da vigência do novo ordenamento constitucional brasileiro, que reconheceu a multietnicidade brasileira e assentou a superação da visão integracionista que influenciava toda a legislação e a interpretação jurisprudencial a respeito de temas ligados aos índios.

O Brasil tem cerca de 230 povos indígenas, que falam cerca de 180 línguas. Cada etnia tem sua identidade, rituais, modo de vestir e de se organizar. Somente em Mato Grosso, há 42 etnias identificadas, o que significa uma população superior a 28 mil indígenas. Número este que retrata a riqueza da diversidade cultural que o Estado possui.

Os povos indígenas não vivem mais como em 1500. Hoje, muitos têm acesso à tecnologia, à universidade e a tudo o que a cidade proporciona. Nem por isso deixam de ser indígenas e de preservar a cultura e os costumes. “Ser índio não é estar nu ou pintado, não é algo que se veste. A cultura indígena faz parte da essência da pessoa. Não se deixa de ser índio por viver na sociedade contemporânea”, explica a antropóloga Majoí Gongora, do Instituto Socioambiental Brasileiro.

População indígena cresce 11,4%

A população indígena cresceu 11,4% em dez anos, somando 817 mil pessoas em 2010, representando 0,4% do total da população brasileira. Nesse mesmo período, os índios brasileiros se espalharam mais pelo território nacional. Em 2010, eles estavam presentes em 80,5% dos municípios contra  63,5% em 200. Os dados são do Censo, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Segundo a pesquisadora Nilza Pereira, do IBGE, ainda não é possível explicar o motivo dessa maior distribuição dos indígenas pelo país. Uma das hipóteses é que as pessoas estejam revalorizando sua identidade ancestral, já que a declaração da etnia é feita pela própria pessoa entrevistada.

Ainda estamos analisando os dados e isso deve ficar mais claro na pesquisa que vamos divulgar em breve. Mas talvez etnias que estariam supostamente extintas podem estar se reassumindo. É um ressurgimento dessa população, avaliou Nilza Pereira.

A Região Norte concentra 37,4% do total de indígenas brasileiros, sendo que o estado do Amazonas responde por 20,6%: 168,7 mil pessoas. O município de São Gabriel da Cachoeira, no noroeste do Amazonas, é onde há um maior número de indígenas: 29 mil. Em Uiramutã, Roraima, há o maior percentual de indígenas: 88,1% da população.

Zona rural
O crescimento da população indígena foi percebido apenas nas zonas rurais, onde o crescimento chegou a 152 mil pessoas, totalizando 502 mil em 2010. São Gabriel da Cachoeira é também o município com maior número de indígenas vivendo na zona rural: 18 mil.

Por outro lado, o número de indígenas autodeclarados residentes nas cidades diminuiu em 68 mil pessoas e chegou a 315 mil em 2010. São Paulo é a cidade com o maior número de indígenas vivendo em zona urbana: 11,9 mil pessoas.

Segundo o IBGE, a redução dos indígenas vivendo em áreas urbanas ocorreu com mais intensidade na Região Sudeste. O instituto acredita que, nessa região, as pessoas deixaram de se declarar indígenas porque perderam a afinidade com seu povo de origem.

Fonte:Correio do Brasil 

Ministro Ayres Brito defende pacto por cumprimento da Constituição

O novo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ayres Britto, defendeu nesta quinta-feira (19) um “pacto pró-Constituição” entre os três Poderes da República. “Esse documento de nome Constituição é fundante de toda a nossa ordem Jurídica. Certidão de nascimento e carteira de identidade do Estado, projeto de vida global da sociedade”, afirmou.

Ao encerrar a solenidade em que foi empossado presidente da Corte, ele distribuiu exemplares atualizados da Constituição como forma de firmar simbolicamente o pacto.

Também foram destaque no primeiro pronunciamento de Ayres Britto como presidente do STF a democracia, classificada por ele como “a menina dos olhos” da nossa Constituição, e seu íntimo enlace com a liberdade de informação.

Para Ayres Britto, a democracia “nos confere o status de país juridicamente civilizado” e mantém com a plena liberdade de informação jornalística “uma relação de unha e carne, de olho e pálpebra, de veias e sangue”, “um vínculo tal de retroalimentação que romper esse cordão umbilical é matar as duas: a imprensa e a democracia”.

O presidente da Suprema Corte acrescentou que a Constituição brasileira tem ainda “o inexcedível mérito de partir do melhor governo possível para a melhor Administração possível”. Porém, advertiu ele, para se chegar ao melhor governo possível não basta a legitimidade pela investidura dos políticos eleitos.

“É preciso ainda a legitimidade pelo exercício, somente obtida se eles, partindo da vitalização dos explícitos fundamentos da República Federativa, venham a concretizar os objetivos também explicitamente adjetivados de fundamentais desse mesmo Estado republicano-federativo”, ponderou.

O presidente Ayres Britto afirmou que nossa Constituição é “primeiro-mundista” e, como tal, investiu na ideia de um Poder Judiciário também primeiro-mundista. Ele observou que se é verdade que os magistrados não governam, o que eles fazem é evitar o desgoverno quando convocados.

Ao final de seu discurso, o presidente Ayres Britto saudou o novo vice-presidente da Corte, ministro Joaquim Barbosa, a quem descreveu como um “paradigma de cultura, independência e honradez”. Ele também se disse honrado em suceder o ministro Cezar Peluso na Presidência do Supremo.

Texto completo:Disponível site do STF
Leia a íntegra do discurso do ministro Ayres Britto, proferido na solenidade de posse na Presidência do Supremo Tribunal Federal, nesta quinta-feira (19).

- Íntegra do discurso de posse do ministro Ayres Britto.

Fonte:STF

Novelas brasileiras passam imagem de país branco, critica escritora moçambicana

                                
                                     Paulina Chiziane, romancista moçambicana
Brasília - "Temos medo do Brasil." Foi com um desabafo inesperado que a romancista moçambicana Paulina Chiziane chamou a atenção do público do seminário A Literatura Africana Contemporânea, que integra a programação da 1ª Bienal do Livro e da Leitura, em Brasília (DF). Ela se referia aos efeitos da presença, em Moçambique, de igrejas e templos brasileiros e de produtos culturais como as telenovelas que transmitem, na opinião dela, uma falsa imagem do país.
"Para nós, moçambicanos, a imagem do Brasil é a de um país branco ou, no máximo, mestiço. O único negro brasileiro bem-sucedido que reconhecemos como tal é o Pelé. Nas telenovelas, que são as responsáveis por definir a imagem que temos do Brasil, só vemos negros como carregadores ou como empregados domésticos. No topo [da representação social] estão os brancos. Esta é a imagem que o Brasil está vendendo ao mundo", criticou a autora, destacando que essas representações contribuem para perpetuar as desigualdades raciais e sociais existentes em seu país.
"De tanto ver nas novelas o branco mandando e o negro varrendo e carregando, o moçambicano passa a ver tal situação como aparentemente normal", sustenta Paulina, apontando para a mesma organização social em seu país.
A presença de igrejas brasileiras em território moçambicano também tem impactos negativos na cultura do país, na avaliação da escritora. "Quando uma ou várias igrejas chegam e nos dizem que nossa maneira de crer não é correta, que a melhor crença é a que elas trazem, isso significa destruir uma identidade cultural. Não há o respeito às crenças locais. Na cultura africana, um curandeiro é não apenas o médico tradicional, mas também o detentor de parte da história e da cultura popular", detacou Paulina, criticando os governos dos dois países que permitem a intervenção dessas instituições.
Primeira mulher a publicar um livro em Moçambique, Paulina procura fugir de estereótipos em sua obra, principalmente, os que limitam a mulher ao papel de dependente, incapaz de pensar por si só, condicionada a apenas servir.
"Gosto muito dos poetas de meu país, mas nunca encontrei na literatura que os homens escrevem o perfil de uma mulher inteira. É sempre a boca, as pernas, um único aspecto. Nunca a sabedoria infinita que provém das mulheres", disse Paulina, lembrando que, até a colonização europeia, cabia às mulheres desempenhar a função narrativa e de transmitir o conhecimento.
"Antes do colonialismo, a arte e a literatura eram femininas. Cabia às mulheres contar as histórias e, assim, socializar as crianças. Com o sistema colonial e o emprego do sistema de educação imperial, os homens passam a aprender a escrever e a contar as histórias. Por isso mesmo, ainda hoje, em Moçambique, há poucas mulheres escritoras", disse Paulina.
"Mesmo independentes [a partir de 1975], passamos a escrever a partir da educação europeia que havíamos recebido, levando os estereótipos e preconceitos que nos foram transmitidos. A sabedoria africana propriamente dita, a que é conhecida pelas mulheres, continua excluída. Isso para não dizer que mais da metade da população moçambicana não fala português e poucos são os autores que escrevem em outras línguas moçambicanas", disse Paulina.
Durante a bienal, foi relançado o livro Niketche, uma história de poligamia, de autoria da escritora moçambicana.
Alex Rodrigues:Repórter da Agência Brasil
Edição: Lílian Beraldo

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Suspenso julgamento de ADI sobre demarcação de terras de Quilombo

Direto do Plenário: STF suspende julgamento de ADI sobre demarcação de terras de quilombo

Um pedido de vista da ministra Rosa Weber suspendeu o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3239, contra o Decreto nº 4.887/2003, que regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos.

O pedido de vista foi formulado logo depois de o presidente do STF, ministro Cezar Peluso, relator, votar pela procedência da ADI 3239 e pela inconstitucionalidade do decreto. Seu voto, porém, mantém a validade dos títulos emitidos desde a entrada em vigor do decreto.

Fonte:site do STF 

Cidadania e Direitos Humanos em sessão histórica do STF

STF julga a regularização de quilomboas nesta quarta dia 18

Por César Augusto Baldi*

Nesta quarta-feira 18, véspera do Dia do Índio, o ministro Cezar Peluso, do Supremo Tribunal Federal, deve levar a julgamento uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI 3239) contra o decreto (nº 4.887/2003) que regulariza a demarcação e titulação das terras quilombolas.

Diversas questões estão envolvidas neste julgamento. [1]

Primeiro, a efetividade de um dispositivo que seria o primeiro passo para exercer o direito de comunidades que esperaram mais de quinze anos para serem regularizadas por orgãos governamentais.
Segundo, o reconhecimento de direitos sociais e coletivos de comunidades negras, não somente por sua contribuição ao patrimônio histórico e social, mas também pela dificuldade que os juristas têm de tratar dos mal denominados “direitos de segunda dimensão” (ou geração).

Terceiro, a proteção de uma dimensão cultural de territorialidade como espaço de reprodução social e simbólica. Na Constituição Federal se inclui, para além de documentos e criações científicas, “formas de expressão, modos de criar, fazer e viver” dos “diferentes grupos formadores da sociedade brasileira”. Trata-se de “justiça cognitiva”, uma vez que tais comunidades são portadoras de saberes e memória social.

Quarto, a noção de “quilombo”, hoje fonte de reconhecimento de direitos, foi criada, originalmente, para fins de criminalização e estigmatização, sendo necessária, portanto, a reparação do fato.

Quinto, a constatação de processos legais de discriminação direta e indireta, ou seja,  de disposições que, aparentemente neutras, tais como a Lei de Terras de 1850, a pretexto de regularem situações jurídicas, eram fonte de negação de direitos de indígenas e negros. Foi um processo em que a imensa concentração de terras, um processo em que expropriação, racismo e colonialismo andaram juntos.

Sexto, a consolidação de processos de monitoramento e de defesa de direitos humanos no sistema internacional de proteção tem providenciado em relação ao reconhecimento do direito de propriedade de comunidades negras em todo o continente americano.

Sétimo, a sinalização, às vésperas da Rio+20, de que a preservação de tais comunidades tem garantido também a manutenção da diversidade ecológica da região. Biodiversidade e sociodiversidade, neste caso, são duas faces do mesmo processo.

Por fim, a necessidade de definição, por parte do STF, de critérios mais objetivos para a realização de audiências públicas e para inclusão em pauta (ou mesmo de ordem de preferência) para julgamento de processos. Recentemente, o Ministro Marco Aurelio salientou a demora para a apreciação de questões envolvendo o aborto de anencéfalos (as audiências públicas ocorreram em 2008) e os procedimentos administrativos relativos a magistrados (constantes da Resolução 135 do CNJ). A ADI 3239, ora pautada, teve seu relatório disponibilizado em 23 de abril de 2010, ou seja, há quase dois anos.

Em mais um julgamento histórico, o STF pode ajudar – ou não – a se avançar na consolidação dos direitos fundamentais de uma parcela da população que tem sido negligenciada, invisibilizada, discriminada e afastada do exercício de seus direitos.  A prevalência dos direitos humanos e o repúdio ao racismo são princípios que regem o Brasil nas relações internacionais; a dignidade da pessoa humana, o pluralismo e a cidadania são fundamentos do Estado Democrático de Direito. Da mais alta Corte do país espera-se que tais compromissos sejam endossados e reforçados, em mais um passo para a efetivação de nossa Constituição.

*César Augusto Baldi, mestre em Direito (ULBRA/RS), doutorando Universidad Pablo Olavide (Espanha), servidor do TRF-4ª Região desde 1989,é organizador do livro “Direitos humanos na sociedade cosmopolita” (Ed. Renovar, 2004).

Fonte: Carta Capital

terça-feira, 17 de abril de 2012

CNBB: Nota oficial sobre o julgamento da titulação das terras quilombolas

Terras secularmente ocupadas

A garantia da propriedade das terras secularmente ocupadas por eles é dever constitucional e compromisso ético-moral”. Desta forma, a presidência da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil se manifestou por meio de nota nesta terça-feira, 17/04, a respeito do julgamento que será realizado pelo Supremo Tribunal Federal quanto à titulação de terras quilombolas pela União.

A Conferência recorda no documento que os artigos 215 e 216 da Constituição Federal asseguram aos quilombolas o direito à preservação da própria cultura e do seu patrimônio imaterial.

Confira, a seguir, a íntegra da declaração:

Diante do iminente julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), da Ação Direta de Inconstitucionalidade, que questiona a titulação de terras quilombolas pela União, como determina o Decreto 4887/2003, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil vem ratificar seu apoio à manutenção do referido Decreto, assegurando o atual processo de reconhecimento, demarcação e titulação das terras quilombolas.

O Brasil tem uma dívida histórica para com a população afro-brasileira, da qual muitos são remanescentes de quilombos. A garantia da propriedade das terras secularmente ocupadas por eles é dever constitucional e compromisso ético-moral.  Os Quilombos são de vital importância na estruturação da cultura brasileira. São espaço do cultivo da terra para a sobrevivência e também da continuidade de um modo de vida original, rico e diverso, reconhecido mundialmente.

Os artigos 215 e 216 da Constituição Federal asseguram aos quilombolas o direito à preservação da própria cultura e do seu patrimônio imaterial. A garantia constitucional do reconhecimento de seus territórios é, portanto, fundamental para a manutenção desta trajetória de resistência.  Acrescente-se, ainda, que o disposto no artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias determina que cabe ao Estado garantir a propriedade dos ocupantes das terras remanescentes dos quilombos.

A CNBB, fundada na norma constitucional, insiste no respeito a estes dispositivos legais que garantem a tradição quilombola ligada à posse e a propriedade da terra. Os territórios quilombolas sustentam a memória cultural, a identidade étnica e são o principio de uma existência cidadã.

Na fidelidade à opção evangélica e preferencial pelos pobres, a CNBB coloca-se, mais uma vez, ao lado das comunidades Quilombolas para as quais pede especial proteção e bênção de Nossa Senhora Aparecida, padroeira e mãe de todos os brasileiros.


Cardeal Dom Raymundo Damasceno Assis
Arcebispo de Aparecida
Presidente da CNBB

Fonte: CNBB


domingo, 15 de abril de 2012

Cidadania Quilombola e o direito à titulação da terra

Comunidades Quilombolas: conceito, autodefinição e direitos

Por Daiane Souza

Até cem anos após a assinatura da Lei Áurea que libertou os escravizados no Brasil, os quilombos eram considerados locais com grandes concentrações de negros que se rebelaram contra o regime colonial. Com a Constituição Federal de 1988, o termo “quilombo” teve seu conceito ampliado de modo que na atualidade é considerado toda área ocupada por comunidades remanescentes dos antigos quilombos.

Atualmente, essas comunidades passam por identificação, autodefinição e certificação, passos administrativos de responsabilidade da Fundação Cultural Palmares para que lhes sejam atribuídas à legalidade e a posse inalienável de seus territórios. Decorrente a posse está a garantia do acesso aos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal.

Professora da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (FE/UnB) e pesquisadora da realidade quilombola, Glória Moura ressalta que os territórios onde vivem esses afro-brasileiros significam mais que simples espaços. De acordo com a professora, a terra além de garantir a subsistência do grupo, tem importância histórica e cultural, pois é onde acontecem as transmissões dos valores éticos e morais, dos conhecimentos definidos pelas manifestações, pelas tradições e pelo respeito à ancestralidade.
a especialista avalia a legislação em defesa da população negra no país e trata do Decreto enquanto ferramenta de reparação às consequências da escravidão e de sua abolição. Confira:

Ascom/FCP – Como pode ser avaliada a legislação em defesa da população negra no Brasil?
Glória Moura - A legislação em defesa da população negra no Brasil ainda é insuficiente para reparar os anos de abusos escravocratas. Ainda há a desvalorização da força de trabalho do negro que em toda sua trajetória, desde sua chegada ao Brasil como africano escravizado, até os dias de hoje, dá sua contribuição à nossa nação.

Ascom/FCP – As comunidades de remanescentes de quilombo, em sua maioria, abrigam elevados números de pessoas em vulnerabilidade nos mais diversos aspectos. O que representa o Decreto 4.887/2003 para a população quilombola?
Glória Moura - O Decreto 4887/2003 foi um avanço em relação à legislação anterior. O conceito foi atualizado e ampliado reservando aos quilombolas o seu direito à história, à cidadania, à cultura e ao direito étnico. Ter garantido seu direito a aspirar aquilo que o Estado deve proporcionar a todos os brasileiros, o acesso à educação, à saúde, ao trabalho e à moradia foi um sonho que deve ser realizado e não pode ser frustrado.

Ascom/FCP – Considerando que o Decreto 4.887/2003 é uma importante ferramenta de reparação aos transtornos promovidos pela abolição da escravidão em nosso país, como avalia a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) proposta pelo Partido Democratas (DEM)?   
Glória Moura - O posicionamento do DEM é pelo menos anti-histórico. Quando comecei a pesquisar as comunidades remanescentes de quilombos, em 1986, elas estavam esquecidas, invisíveis e não se podia imaginar o número atual. Querer questionar a constitucionalidade é negar a realidade quilombola e sua forte influência na história de resistência do negro no Brasil, sua importância para toda a História do país e a reafirmação da identidade étnica dos brasileiros.

Ascom/FCP – É possível prever os impactos da anulação do documento para essas comunidades, caso ocorra?     
Glória Moura - Acredito que será um retrocesso no projeto de titulação das terras quilombolas. O território é imprescindível para os moradores das comunidades em muitos aspectos: o da sobrevivência, do sustento, da colheita e do plantio, da cultura (é onde eles fazem suas festas e seus rituais, onde dançam e cantam), é onde realizam suas tradições, criam e recriam valores. O direito de serem diferentes sem serem desiguais, de manterem suas tradições, inovando-as, como sempre fizeram.

Ascom/FCP – Qual a expectativa quanto ao julgamento?      
Glória Moura - O Supremo Tribunal Federal tem apresentado um crescimento em relação aos julgamentos de teses ligadas aos direitos das minorias. Portanto a expectativa é que se julgue pela manutenção do Decreto 4887/2003. Os direitos garantidos na Constituição Federal de 1988 devem ser levados em consideração.

Ascom/FCP – O que pode ser mudado para que exista maior compreensão da sociedade quanto às comunidades quilombolas?  
Glória Moura - Gostaria de destacar a importância dos estudos sobre Quilombos no Brasil, principalmente no que diz respeito a sua cultura. O artigo 12 do Estatuto da Igualdade Racial estimula justamente isso. Ele diz que os órgãos federais, distritais e estaduais de fomento à pesquisa e à pós-graduação podem criar incentivos às pesquisas e aos programas de estudo voltados para temas referentes às relações étnicas, aos quilombos e às questões pertinentes à população negra.

Fonte: Fundação Cultural Palmares

sábado, 14 de abril de 2012

Quilombolas acompanharão julgamento sobre titulação dos territórios quilombolas

Cidadania Participativa:  Quilombolas reunem-se em Brasilia para acompanhar julgamento histórico de Ministros do Supremo Tribunal Federal

Reginaldo Bispo

O Supremo Tribunal Federal (STF) deverá votar na próxima quarta-feira, 18, a ADIN 3239, do Partido Democratas (DEM), contra o Decreto 4887, que disciplina as titulações dos territórios quilombolas. Em vista dessa votação e contra a aprovação e seguimento da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215, que visa transferir do Executivo para o Legislativo a demarcação de terras quilombolas e indígenas, cerca de 800 quilombolas realizam mobilizações na próxima semana, em Brasília. O movimento indígena estará junto.

Atualmente, são mais de 5000 comunidades que se reivindicam quilombolas em todo o país. Comunidades que ao longo dos quase 400 anos de escravismo e nos últimos 124, após a abolição, resistem bravamente às investidas brutais e criminosas, dos escravistas, dos latifundiários, e agora dos ruralistas do agronegócio exportador, das madeireiras, das mineradoras, do próprio Estado brasileiro, dos governos estaduais e municipais.

A questão fundiária no Brasil sempre foi tratada pelas oligarquias rurais e agrárias e pelos governos de forma reacionária, um tabu imexível, na perspectiva de mantê-los sob o controle dessas propriedades, cada vez maiores, através da grilagem, expulsão, atentados e assassinatos de lideranças quilombolas, indígenas, de sindicalistas e pequenos camponeses, de trabalhadores rurais sem terra, ambientalistas e religiosos solidários, sem que os governos lhes garantam a proteção de direito.

Nos dias 14 e 15 de Abril, acontecerá o Seminário da Frente Nacional em Defesa da Titulação dos Territórios Quilombolas, na CONTAG, também em Brasília, para discutir as formas de mobilização e de organização da Frente. Nos dias 16 e 17, os quilombolas participarão de um mutirão de pressão sobre o executivo e o legislativo, e no dia 18 de um grande ato em frente ao STF, pela rejeição da ADIN do DEM e dos ruralistas.

O desenvolvimento sustentável do Brasil, com respeito à natureza, passa pelo reconhecimento e preservação dos territórios das comunidades quilombolas, indígenas e tradicionais. Passa pela democratização do acesso e a garantia de posse da terra a quem nela vive e produz, diminuindo assim a pressão sobre os grandes centros urbanos, aumentando e barateando a oferta de alimentos saudáveis (o produzido pelo agronegócio é puro veneno, utilizam de defensivos agroquímicos em grande escala).

Trata-se também de uma questão de justiça e cidadania, pois lança as bases de um Projeto Político de Nação (inexistente no Brasil até hoje), incluindo-os e garantindo seus direitos enquanto brasileiros, bem como a segurança (de morar, produzir, criar seus filhos, educar, viver e praticar a sua cultura em paz, sem sofrer a violência das elites) destes segmentos rurais tão vilipendiados e violentados em seus direitos enquanto brasileiros nos últimos cinco séculos.

Milhares de militantes, de todo o Brasil, estão se dirigindo a Brasília. Temos por enquanto, a confirmação dos quilombolas da Frente Nacional em Defesa da Titulação dos Territórios Quilombolas dos estados do Maranhão, Rio Grande do Sul, Bahia, Goiás, Minas Gerais, Santa Catarina, Pará, Rio de Janeiro e Distrito Federal. Centenas de lideranças e entidades do Movimento Negro brasileiro também estão indo em apoio, enquanto organizações quilombolas e do Movimento Negro farão vigílias e manifestações em suas próprias cidades e estados.

Reginaldo Bispo, é Coordenador Político do Movimento Negro Unificado (MNU)

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Entidades condenam declaração de Dilma sobre tortura

Brasília (Agência Brasil) - Um grupo formado por dez entidades da sociedade civil que atuam no combate à violência repudiou a posição da presidenta Dilma Rousseff em relação à tortura em delegacias, expressada em seu discurso feito na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, na última terça-feira (10). Em nota divulgada ontem (11), essas entidades consideram “inadmissível” a presidenta dizer que não tem “como impedir em todas as delegacias do Brasil de haver tortura”.

A declaração ocorreu em um contexto no qual a presidenta evitava comentar a situação de uma prisioneira política na Venezuela. Dilma disse ainda que não aceita fazer “luta política” envolvendo questões de direitos humanos. “É muito grave que a autoridade máxima do país se declare incapaz para coibir o crime de tortura nas delegacias. E é ainda mais grave que tenha escolhido um momento de enorme visibilidade para fazer tal declaração”, ressalta a nota das entidades.

“O país enfrenta hoje um debate acalorado sobre o estabelecimento da Comissão da Verdade, que conta com o apoio da presidente, para esclarecer crimes praticados durante a ditadura militar, incluindo o crime de tortura”, destaca o documento.

O texto é assinado pela Associação dos Cristãos para Abolição da Tortura (Acat), Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia), pelo Centro de Direitos Humanos Dom Oscar Romero (Cedhor), pela Conectas Direitos Humanos, pelo Instituto Desenvolvimento e Direitos Humanos (IDDH), Instituto Terra, Trabalho, e Cidadania (ITTC), Instituto Vladimir Herzog, Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), pela Justiça Global e pela Pastoral Carcerária.

As entidades esperam que a Presidência “aclare com rapidez em que medida tal declaração reflete a posição do Estado brasileiro sobre o assunto”. “Pedimos uma declaração explícita da presidente de que não tolerará a tortura e empenhará todos os esforços para combatê-la”, destacam.

Na nota, as entidades também cobram o Estado brasileiros por não ter colocado ainda em prática o mecanismo de prevenção à tortura, conforme compromisso assumido na Organização das Nações Unidas (ONU), em 2008.

“O governo brasileiro reluta também há mais de dois meses em dar publicidade ao relatório do Subcomitê de Prevenção da Tortura da ONU, que visitou o Brasil em setembro de 2011. Por fim, o país falha repetidamente em não adotar medidas capazes de coibir a prática desse crime em inúmeros centros de detenção provisória, presídios e unidades socioeducativas”, destaca o documento.


quarta-feira, 11 de abril de 2012

Marilena Chauí: Ditadura iniciou devastação da escola pública

Violência repressiva, privatização e a reforma universitária que fez uma educação voltada à fabricação de mão-de-obra, são, na opinião da filósofa Marilena Chauí, professora aposentada da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, as cicatrizes da ditadura no ensino universitário do país.

Em conversa com a Rede Brasil Atual, Chauí relembrou as duras passagens do período e afirma não mais acreditar na escola como espaço de formação de pensamento crítico dos cidadãos, mas sim em outras formas de agrupamento, como nos movimentos sociais, movimentos populares, ONGs e em grupos que se formam com a rede de internet e nos partidos políticos.

Rede Brasil Atual: Quais foram os efeitos do regime autoritário e seus interesses ideológicos e econômicos sobre o processo educacional do Brasil?
Marilena Chauí: Vou dividir minha resposta sobre o peso da ditadura na educação em três aspectos. Primeiro: a violência repressiva que se abateu sobre os educadores nos três níveis, fundamental, médio e superior. As perseguições, cassações, as expulsões, as prisões, as torturas, mortes, desaparecimentos e exílios. Enfim, a devastação feita no campo dos educadores. Todos os que tinham ideias de esquerda ou progressistas foram sacrificados de uma maneira extremamente violenta.

Em segundo lugar, a privatização do ensino, que culmina agora no ensino superior, começou no ensino fundamental e médio. As verbas não vinham mais para a escola pública, ela foi definhando e no seu lugar surgiram ou se desenvolveram as escolas privadas. Eu pertenço a uma geração que olhava com superioridade e desprezo para a escola particular, porque ela era para quem ia pagar e não aguentava o tranco da verdadeira escola. Durante a ditadura, houve um processo de privatização, que inverte isso e faz com que se considere que a escola particular é que tem um ensino melhor. A escola pública foi devastada, física e pedagogicamente, desconsiderada e desvalorizada.
Rede Brasil Atual: E o terceiro aspecto?
MC: A reforma universitária. A ditadura introduziu um programa conhecido como MEC-Usaid, pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos, para a América Latina toda. Ele foi bloqueado durante o início dos anos 1960 por todos os movimentos de esquerda no continente, e depois a ditadura o implantou.

Essa implantação consistiu em destruir a figura do curso com multiplicidade de disciplinas, que o estudante decidia fazer no ritmo dele, do modo que ele pudesse, segundo o critério estabelecido pela sua faculdade.
Os cursos se tornaram sequenciais. Foi estabelecido o prazo mínimo para completar o curso. Houve a departamentalização, mas com a criação da figura do conselho de departamento, o que significava que um pequeno grupo de professores tinha o controle sobre a totalidade do departamento e sobre as decisões.

Então você tem centralização.

Foi dado ao curso superior uma característica de curso secundário, que hoje chamamos de ensino médio, que é a sequência das disciplinas e essa ideia violenta dos créditos. Além disso, eles inventaram a divisão entre matérias obrigatórias e matérias optativas. E, como não havia verba para contratação de novos professores, os professores tiveram que se multiplicar e dar vários cursos.
Rede Brasil Atual: Houve um comprometimento da inteligência?
MC: Exatamente. E os professores, como eram forçados a dar essas disciplinas, e os alunos, a cursá-las, para terem o número de créditos, elas eram chamadas de “optatórias e obrigativas”, porque não havia diferença entre elas. Depois houve a falta de verbas para laboratórios e bibliotecas, a devastação do patrimônio público, por uma política que visava exclusivamente a formação rápida de mão de obra dócil para o mercado.

Aí, criaram a chamada licenciatura curta, ou seja, você fazia um curso de graduação de dois anos e meio e tinha uma licenciatura para lecionar. Além disso, criaram a disciplina de educação moral e cívica, para todos os graus do ensino. Na universidade, havia professores que eram escalados para dar essa matéria, em todos os cursos, nas ciências duras, biológicas e humanas. A universidade que nós conhecemos hoje ainda é a universidade que a ditadura produziu.

Rede Brasil Atual: Essa transformação conceitual e curricular das universidade acabou sendo, nos anos 1960, em vários países, um dos combustíveis dos acontecimentos de 1968 em todo mundo.
MC: Foi, no mundo inteiro. Esse é o momento também em que há uma ampliação muito grande da rede privada de universidades, porque o apoio ideológico para a ditadura era dado pela classe média. Ela, do ponto de vista econômico, não produz capital, e do ponto de vista política, não tem poder. Seu poder é ideológico.

Então, a sustentação que ela deu fez com que o governo considerasse que precisava recompensá-la e mantê-la como apoiadora, e a recompensa foi garantir o diploma universitário para a classe média. Há esse barateamento do curso superior, para garantir o aumento do número de alunos da classe média para a obtenção do diploma. É a hora em que são introduzidas as empresas do vestibular, o vestibular unificado, que é um escândalo, e no qual surge a diferenciação entre a licenciatura e o bacharelato.

Foi uma coisa dramática, lutamos o que pudemos, fizemos a resistência máxima que era possível fazer, sob a censura e sob o terror do Estado, com o risco que se corria, porque nós éramos vigiados o tempo inteiro.

Os jovens hoje não têm ideia do que era o terror que se abatia sobre nós. Você saía de casa para dar aula e não sabia se ia voltar, não sabia se ia ser preso, se ia ser morto, não sabia o que ia acontecer, nem você, nem os alunos, nem os outros colegas. Havia policiais dentro das salas de aula.

Rede Brasil Atual: Houve uma corrente muito forte na década de 60, composta por professores como Aziz Ab’Saber, Florestan Fernandes, Antonio Candido, Maria Vitória Benevides, a senhora, entre outros, que queria uma universidade mais integrada às demandas da comunidade. A senhor tem esperança de que isso volte a acontecer um dia?
MC: Foi simbólica a mudança da faculdade para o “pastus”, não é campus universitário, porque, naquela época, era longe de tudo: você ficava em um isolamento completo. A ideia era colocar a universidade fora da cidade e sem contato com ela. Fizeram isso em muitos lugares. Mas essa sua pergunta é muito complicada, porque tem de levar em consideração o que o neoliberalismo fez: a ideia de que a escola é uma formação rápida para a competição no mercado de trabalho. Então fazer uma universidade comprometida com o que se passa na realidade social e política se tornou uma tarefa muito árdua e difícil.

Rede Brasil Atual: Não há tempo para um conceito humanista de formação?
MC: É uma luta isolada de alguns, de estudantes e professores, mas não a tendência da universidade.

Rede Brasil Atual: Hoje, a esperança da formação do cidadão crítico está mais para as possibilidades de ajustes curriculares no ensino fundamental e médio? Ou até nesses níveis a educação formal estará comprometida com a produção de cabeças e mãos para o mercado?
MC: Na escola, isso, a formação do cidadão crítico, não vai acontecer. Você pode ter essa expectativa em outras formas de agrupamento, nos movimentos sociais, nos movimentos populares, nas ONGs, nos grupos que se formam com a rede de internet e nos partidos políticos. Na escola, em cima e em baixo, não. Você tem bolsões, mas não como uma tendência da escola.

Fonte: Rede Brasil Atual

terça-feira, 3 de abril de 2012

Supremo deve julgar ação sobre Terras Quilombolas no dia 18 de abril

Depois de oito anos de espera, a ação que trata da ocupação de terras por descendentes de quilombolas será julgada no dia 18 de abril no Supremo Tribunal Federal (STF).

Valdisio Fernandes

O processo é o último tema de relevância social pautado por Cezar Peluso, já que o ministro Carlos Ayres Britto assume a presidência do STF no dia 19 de abril. Peluso é o relator do processo e prometeu colocar o caso em julgamento desde os primeiros meses na presidência da Corte. A ADI 3239 - Ação Direta de Inconstitucionalidade referida ao Decreto nº 4.887, de 20 de novembro de 2003, perpetrada pelo DEM tenta impugnar o uso da desapropriação na efetivação do art.68 ADCT da constituição de 1988, que reconheceu a propriedade definitiva das terras quilombolas.

O MDA estimou em 2004 que as terras quilombolas representem 5% do total de 850 milhões de hectares do território brasileiro (o movimento negro estima o dobro disso). Nesse quadro o MDA admite que haja 200 milhões de hectares sobre os quais o cadastro do Incra não possui qualquer informação. A titulação das terras das comunidades quilombolas pode se constituir num destacado instrumento de desconcentração da propriedade fundiária, contrapondo-se frontalmente à dominação oligárquica.

O fato de a propriedade quilombola aparecer sempre condicionada ao controle de associações comunitárias torna-a, entretanto, um obstáculo às tentativas de transações comerciais e praticamente as imobiliza enquanto mercadoria. As terras das comunidades quilombolas cumprem sua função social essencial quando o grupo étnico, manifesto pelo poder da organização comunitária, gerencia os recursos no sentido de sua reprodução física e cultural, recusando-se a dispô-los às transações comerciais.

Representada como forma coletiva a propriedade quilombola favorece a família, a comunidade.

Fonte: Instituto Buzios     http://www.institutobuzios.org.br/
          Inesc e Fundação Bolls

O caso Demóstenes Torres e as raposas no galinheiro

O rumoroso caso Demóstenes Torres é uma chance única de reavaliar o que foi a política brasileira na última década, e de como ela – venal, hipócrita e manipuladora – foi viabilizada por um estilo de cobertura política irresponsável, manipuladora e, em alguns casos, venal. E hipócrita também.

Maria Inês Nassif

O rumoroso caso Demóstenes Torres (DEM-GO) não é apenas mais um caso de corrupção denunciado pelo Ministério Público. É uma chance única de reavaliar o que foi a política brasileira na última década, e de como ela – venal, hipócrita e manipuladora – foi viabilizada por um estilo de cobertura política irresponsável, manipuladora e, em alguns casos, venal. E hipócrita também.

Teoricamente, todos os jornais e jornalistas sabiam quem foram os arautos da moralidade por eles eleitos nos últimos anos: representantes da política tradicional, que fizeram suas carreiras políticas à base de dominação da política local, que ocuparam cargos de governos passados sem nenhuma honra, que construíram seus impérios políticos e suas riquezas pessoais com favores de Estado, que estabeleceram relações profícuas e férteis com setores do empresariado com interesses diretos em assuntos de governo.

Foram políticos com esse perfil os escolhidos pelos meios de comunicação para vigiar a lisura de governos. Botaram raposas no galinheiro.

Nesse período, algumas denúncias eram verdadeiras, outras, não. Mas os mecanismos de produção de sensos comuns foram acionados independentemente da realidade dos fatos. Demóstenes Torres, o amigo íntimo do bicheiro, tornou-se autoridade máxima em assuntos éticos. Produziu os escândalos que quis, divulgou-os com estardalhaço. Sem ir muito longe, basta lembrar a “denúncia” de grampo supostamente feita pelo Poder Executivo no gabinete do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, então presidente da mais alta Corte do país. Era inverossímil: jamais alguém ouviu a escuta supostamente feita de uma conversa telefônica entre Demóstenes, o amigo do bicheiro, e Mendes, o amigo de Demóstenes.

Os meios de comunicação receberam a suposta transcrição de um grampo, onde Demóstenes elogia o amigo Mendes, e Mendes elogia o amigo Demóstenes, e ambos se auto-elegem os guardiões da moralidade contra um governo ditatorial e corrupto. Contando a história depois de tanto tempo, e depois de tantos escândalos Demóstenes correndo por baixo da ponte, parece piada. Mas os meios de comunicação engoliram a estória sem precisar de água. O show midiático produzido em torno do episódio transformou uma ridícula encenação em verdade.

A estratégia do show midiático é conhecida desde os primórdios da imprensa. Joga-se uma notícia de forma sensacionalista (já dizia isso Antonio Gramsci, no início do século passado, atribuindo essa prática a uma “ imprensa marrom”), que é alimentada durante o período seguinte com novos pequenos fatos que não dizem nada, mas tornam-se um show à parte; são escolhidos personagens e lhes é conferida a credibilidade de oráculos, e cada frase de um deles é apresentada como prova da venalidade alheia. No final de uma explosão de pânico como essa, o consumo de uma tapioca torna-se crime contra o Estado, e é colocado no mesmo nível do que uma licitação fraudulenta. A mentira torna-se verdade pela repetição. E a verdade é o segredo que Demóstenes – aquele que decide, com seus amigos, quem vai ser o alvo da vez – não revela.

Convenha-se que, nos últimos anos, no mínimo ficou confusa a medida de gravidade dos fatos; no outro limite, tornou-se duvidosa a veracidade das denúncias. A participação da mídia na construção e destruição de reputações foi imensa. Demóstenes não seria Demóstenes se não tivesse tanto espaço para divulgação de suas armações. Os jornais, tevês e revistas não teriam construído um Demóstenes se não tivessem caído em todas as armadilhas construídas por ele para destruir inimigos, favorecer amigos ou chantagear governos. Os interesses econômicos e ideológicos da mídia construíram relações de cumplicidade onde a última coisa que contou foi a verdade.

Ao final dos fatos, constata-se, ao longo de um mandato de oito anos, mais um ano do segundo mandato, uma sólida relação entre Demóstenes e a mídia que, com ou sem consciência dos profissionais de imprensa, conseguiu curvar um país inteiro aos interesses de uma quadrilha sediada em Goiás.

Interesses da máfia dos jogos transitaram por esse esquema de poder. E os interesses abarcavam os mais variados negócios que se possa fazer com governos, parlamentos e Justiça: aprovação de leis, regras de licitação, empregos públicos, acompanhamento de ações no Judiciário. Por conta de um interesse político da grande mídia, o Brasil tornou-se refém de Demóstenes, do bicheiro e dos amigos de ambos no poder.

Não foi a mídia que desmascarou Demóstenes: a investigação sobre ele acontece há um bom tempo no âmbito da Polícia Federal e do Ministério Público Federal. Nesse meio tempo, os meios de comunicação foram reféns de um desconhecido personagem de Goiás, que se tornou em pouco tempo o porta-voz da moralidade. A criatura depõe contra seus criadores.

Maria Ines Nassif é Colunista Política, editora da Carta Maior em São Paulo

Fonte: Carta Maior